quarta-feira, 31 de março de 2010



"I said what I said but you know what I mean"

Do subsolo.

"We were aiming for the moon,
we were shooting at the stars,
but the kids were just shooting at the busses and the cars"


E é assim que funciona aqui embaixo. Lembre-se que você até viu o pôr-do-sol e que estava com dor de barriga, que as crianças são saudáveis e inteligentes e não serão médicas e que você o amou um dia... um dia. E é assim que funciona quando você lê o poema aí de cima, porque são essas lembranças que sobram aqui embaixo. Nas nossas ruas moram o palhaço sem maquiagem, o poeta nunca lido e num daqueles quitinetes da esquina vive o cantor que morreu de aids. Recentemente abrimos um museu. Pois é, nós temos umas entranhas de gente famosa por lá e eu soube que vão construir uma ala especial para o passado vergonhoso que vocês escondem aí em cima. Tinham a intenção de fazer uma parte pra cada tempo, sabe? Mas daqui a uns tempos teremos que entregar o futuro desastroso que vocês insistem em querer guardar aqui embaixo...
De qualquer forma, eu tenho um recado da sua consciência faz tempo: é que queria sair daqui debaixo de vez em quando, entende? Ela acha que poderia ser útil...

Desjuízo

"Queria o mundo pr'eu me saciar e um megafone pra ouvir dizer. pelas antenas que vão avisar por deus. ou o diabo que vai te falar que o fim do mundo não acaba a vida. na luz vermelha da antena já dá pra ver. talvez eu fique, quem sabe você vá. diz-se apenas que um dia estaremos de novo no mesmo lugar. eu vou esperar você. o que ninguém sabe, a antena dirá, não aos ouvidos, mas ao nosso olhar. queria ir no que está por vir, já que eu não sei se seremos assim ou se outros, como nós fazemos agora, falarão por nós."

Quem sou eu pra falar do fim. Eu só posso esperar e descarbonizar-me. Onde eu vou parar não me importa mais, que eu não sei nem onde piso. Pra que apontar essas luzes que olham do céu, se me atropelarem essas luzes que correm no chão? Se todo mundo é colorido, já não importa mais, se todo mundo vê o mundo em preto e branco.

Ser é mais que ser. E já que eu não quero ser só você, eu lavo as minhas mãos e eu fecho os olhos e no escuro posso ser qualquer um.

sábado, 27 de março de 2010



só com a rita.

segunda-feira, 22 de março de 2010

Presente feito em casa

- Vai quebrar, vai quebrar.
quebrou.
- Eu avisei, não avisei?
Tinha que ser delicado e tinha que ter os dedos leves, levinhos, levíssimos.
Mas enquanto tentava entender que -íssimos não fazem parte da poética dos barbantes, ele errava, rasgava e tantava de novo.
- Olha só, cuidado... cuidado. Não!
Outro.
Enquanto isso se perdiam os panos, as linhas e os barbantes. Além do sentido de carinho da coisa.

Sudoeste

"Tenho por princípios nunca fechar portas
mas como mantê-las abertas
o tempo todo?
se em certos dias o vento quer derrubar tudo."

Adriana Calcanhotto

Uns pedacinhos do fim

Eu não explodo, nunca. na verdade me parece mais que eu apenas perco pedaços e me desconstruo. fosse feito só de esperanças, a essa altura eu talvez só tivesse pés. por causa da vida, temo perdê-los. creio que dentro de alguns dias serei apenas um dedo. para apontar tudo que já me aconteceu. sinceramente, eu não sei o que fazer, não me parece boa idéia tentar me proteger agora, se é que já não o faço. já não sinto com integridade todas as seções da minha vida, certas galerias não possuem mais um quadro a perder, outras paredes começam a ser preenchidas agora, com obras que eu nunca sonhei possuir, mas que eu temo, como temo tudo que é necessário.
Acho que brevemente terei simplesmente que fechar portas, depois de enxaguar o chão e cerrar as janelas, negar luzes. aos visitantes futuros e aos possíveis atuais, peço perdão, mas agora espero que apenas saia, depois de ficar à vontade para aprender o que quiser com o que sobrou de mim.
Parece haver muito mais a dizer, mas meus olhos pesam e não quero molhar o papel. isso tem se tornado cada vez mais frequente, essa pressão atrás dos meus olhos e o nó na minha garganta. quero parar nos registros apenas, sabendo que nada irá se interromper na linha de existência.
Agora acho que certas obras deveriam me pertencer apenas.

Asilos Magdalena



"Enfermo cheguei
E para me compor
Ando incerto
Não me dê sua obediência
Porque te mostro meu corpo de lobo
De onde a pele estava débil
Com uma fome que não me deixa cantar

Na minha vida
O escuro me mantém
Quando eu te vi
Na chuva me prometeste teu sangue
Eu não fico...

E já que caíste deste mundo
Carrego uma navalha
Deus meu!
Para você
Quantas vezes me mordeste
E quantas vezes eu me fui

E já não estou apaixonado
Com tuas mentiras
No inferno durmo
Porque o inferno é a única verdade"

Cedric Bixler-Zavala

sexta-feira, 5 de março de 2010

Mexerico

Numa calçada do Éden, conversam Adão e um coelho, enquanto passa o tempo.
- Olha aí o tempo!
- Opa!
- Opa!
- Opa!

...

- Sempre apressado ele, né? Deve de ser muito ocupado.
- É, mas quem se ocupa muito, Adão, é porque tem pouco o que fazer.

A parte que te cabe

Correm as horas, dobram os sinos, latem, ladram, mordem os cães.
Morrem os homens
Vivas às mulheres
e crianças primeiro.
O oxigênio passa
O pulmão não vê
A tinta colore
O muro separa
E derruba o muro qualquer um que quiser.
O autor escreve
O artista recita
Quem vê inveja, admira, critica.
O sol nasce, queima e morre.
deus esquece
o diabo não.
E eu...
Eu.
Eu espero.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Por amor a gravidade

Eu tive tanta pressa naquele dia. Como nunca caia nada em meu telhado estranhei o barulho na minha cabeça. Algo está errado quando se pensa errado. Isso é mais lógico do que realmente possa ser. E alguém me diria que era só barulho em chuva caindo. Ou que eu imaginava coisas. Que eu desenhava coisas que desejava. Me falaram sobre uma lógica que se aplica a todas as coisas. E eu apenas desejava ser mais colorido em papel. Mais vivo assim com um sorriso bem grande. Uma grande fatia de melancia vermelha. E olhos pequenos pra não poder ver o que realmente acontece agora. Eu só queria sim. Parecer subjetivamente mais vivo. Enrolado num grande lençol amarelo. Fingindo ser um fantasma. Uma alma do passado perdida entre mundos que parecem estranhamente unidos pela grande fé dos que dizem ter fé.
Não me sinto assim tão compreendido. Nem deveria. Viraram os holofotes na minha direção e meus olhos só ardem. Através dessa luz consigo ver reflexos do que não deveriam ser nada. Se não há nada a refletir em holofotes eles não são espelhos. Acho que sou eu quem não entende as coisas como devem ser entendidas. Distorcendo a realidade em luzes e cores que só existem pros meus olhos. E refletindo sobre existencialismos falsos. Colocando o pé antes de olhar o caminho. Caindo sem perceber. Tropeçando na vida alheia como se fosse comum. Quem não vê o mundo assim como essa grande esfera comum sou eu. Ou talvez, seja meu pensamento falando comigo mesmo em voz alta, que me faça pensar que isso é estranho e rico em detalhes que desconheço. Eu simplesmente acho que novamente caí em delírio. Eu falhei.