quarta-feira, 29 de julho de 2009

coágulo

trilha-se esse caminho pulando veias e feridas abertas
não temos nem ao menos a descência de sangrar, derramar, descascar
ouve-se muita voz
houve-se voz demais
e todas são uma só
que não pede
implora
e não manda
ordena

e não aconselha
avisa

enquanto as bocas se abrem aos ouvidos
e o mundo se fende aos nossos pés
esperamos que o céu se abra sobre nossas cabeças num circo pirotécnico
que caiam sentenças sobre todo mal
nosso toque sinestésico
o disfarce
do desejo
meu cianeto
tua escravidão

tua foda
tua merda
todo fluido
tua culpa

mas por que?
se não descasco, não sangro, não derramo.
vê-se alguém morrer com essas feridas abertas
uma voz sem culpa
sem desejo
sem descência.

domingo, 26 de julho de 2009

Estela

Quando ela se jogou
não foi por nenhum mirar
que essa luz se apagou

acho que foi a vida
de esperar o sol se pôr
depois de tanto rezar
pro tempo negligênciar
todo agora.

talvez nunca se chegue lá
quem sabe nunca se alcance
e eles dizem que muito do que se vê
já é findo.

domingo, 5 de julho de 2009

Ripping paper

Emendando náuseas. Tudo é tão sequencial e continuado. Quadro a quadro, como numa galeria, todas as obras parecem independentes. Sei que existe tempo e momento juntando os mindinhos de cada pintura, desenho, retrato. Cada tristeza e dor trazem em si sua arte independente, eu no entanto, por tempo e momento, sem perceber, emendo náuseas, todas em uma só tela de arte final. Tantos quadros e você poderia jurar que vê apenas uma pintura repetida parede após parede, porém quem entra nas minhas galerias entra sabendo que pouco é o que parece e nada veio no mesmo tempo, no mesmo momento. Hoje, no entanto, como em todo fim eu decido não mais pendurar a mesma obra, nem mesmo uso qualquer tela. Esta ala se fecha como algumas outras lá trás no caminho e pra garantir um fim, hoje sem tela, toda a tinta vai na parede. Eu sei, nada nunca põe fim à náusea, mas eu acho que tantas paredes merecem mais tempo. Mais momento. E tanto papel pode ser rasgado...

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Insight

"acho que os sonhos são finitos
ele não afloram
apenas decaem
mas eu não ligo mais
eu perdi a vontade de querer mais
eu não sinto nenhum medo
eu os observo enquanto caem
mas eu me lembro de quando éramos mais jovens

aqueles com hábitos de desperdiçar
a noção de estílo e bom gosto
de ter certeza de que se está certo
você não percebe que estava certo?
eu não sinto mais medo
mantenho meus olhos sobre a porta
mas eu me lembro...

lágrimas e tristezas por você
o temor de que te façam algum mal
reflete um momento no tempo
um momento especial no tempo
é certo que jogamos fora o nosso
o tempo que nem mesmo tinhamos
mas nós lembramos de quando éramos mais jovens

e todos os anjos observem
e aqueles que julgam, observem
aqueles que se arriscam prestem atenção
àqueles todos que não estão por aqui
eu não tenho mais medo."

Ian Curtis

Eu, nº 1417

Well, the music is over and they turned off the lights. Mas eu ainda estou aqui, o último, porém não um resumo ou uma conclusão. Apenas a sobra, assim mesmo, nesse tom, de conformismo, de quem já esperava ter de arrumar tudo no final, pôr as cadeiras sobre as mesas. Nem pior, nem melhor, o último apenas.

Não sou poético, ninguém é, no fim, todos cansam e vão para atrás das cortinas. Todos tiram suas máscaras e se descobrem exaustos de toda a comédia e tragédia da vida. No fim, ninguém se importa. Eu não me importo. Eu gosto de coisas que não fazem nem a mínima diferença, reparar no piscar dos meus próprios olhos, no último pulsar da luz na tela, o toque da pele na colcha usada. Encolher-me e sentir o queixo nos joelhos, piscar, abrir, fechar os olhos no escuro. Fechar o corpo. Fechar o mundo. Até que os outros se tornem apenas o termo e nada mais. Que ocupem o medo e a esperança, que se percam a vontade e a memória. Esse é o último eu, lost some sleep and said I tried.