domingo, 1 de março de 2009

Da vida das coisas

O fio se estende no ar sem um ponto de chegada. Ou de partida, não se sabe ao certo. Como as escadas que levam ao nada nos cantinhos das praças recém construídas.
E durante aquele instante o fio saía de um poste sem chegar a outro, sem chegar ao chão nem a nada que o mantivesse ali, suspenso feito braço e mão e dedo de moça, apontando o vazio azul do céu de meio dia. Por um instante, um breve instante. E manteve a pose, como criança que espera a reação à arte, como penteado novo, num orgulho que apenas espera, sem pedir, o elogio.

Por um instante, um breve instante.

E veio o menino e catou a bola fujona.
E passou o moço com a gravidade nos olhos e o olhar no chão. As pessoas cruzam com o amor, mas nem sempre o cumprimentam.
E passaram os pássaros num bater cansado de asas.
E passou a brisa atrasada.
Passou o silêncio.
- Desista. Gritou a folha seca e amarela do chão. – Eu voei daquela árvore e ninguém notou.
- Desista. Suspirou a pedra. – Do tempo eu tanto sei e ninguém, nunca, perguntou.

- Desista. Sussurrou o céu.

E o fio deitou no chão como o sorriso desacompanhado que se fecha.

E o instante, num breve instante, se perdeu.

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